Série "Veredas mortas", do EM recebe prêmio Hugo Werneck
Reportagens especiais revelaram, em jornada de 5 mil quilômetros, a agonia de paisagens imortalizadas na obra de Guimarães Rosa
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Siga noA série de reportagens especiais “Veredas mortas”, publicadas pelo jornal Estado de Minas e pelo portal Uai entre os dias 14 e 29 de julho de 2024 denunciando a devastação das veredas e do cerrado em paisagens imortalizadas por João Guimarães Rosa no clássico “Grande sertão: Veredas” (1956), é a vencedora do 15º Prêmio Hugo Werneck na categoria “Melhor exemplo em comunicação ambiental”. A cerimônia de premiação, que distinguiu o trabalho dos repórteres Mateus Parreiras e Luiz Ribeiro e do repórter fotográfico Alexandre Guzanshe, ocorreu no Centro de Convenções da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), na noite de terça-feira, com a presença de ambientalistas e autoridades.
O repórter Mateus Parreiras e o diretor de Redação do Estado de Minas, Carlos Marcelo Carvalho, receberam o prêmio e descreveram as origens da série e como o trabalho – que envolveu aproximadamente 20 profissionais entre repórteres de texto e fotográficos, editores de texto, de vídeo, de imagens e de arte, diagramadores e equipes de apoio – tomou corpo. A proposta nasceu da investigação literária do diretor em relação ao clássico do escritor mineiro – cuja primeira menção na imprensa surgiu sob o nome “Veredas mortas”, que batizou a série –, e resultou na minuciosa apuração de campo sobre a ameaça que avança sobre o sertão de Rosa.
“Foi um trabalho enorme de equipe, costurando histórias de Guimarães Rosa. O Carlos descobriu as 'Veredas mortas' (como primeiro título pensado para a obra). Nossa ideia foi procurar essas veredas e mostrar o que as está matando hoje; mostrar processos que, se não forem feitos das formas devidas, vão acabar com essas paisagens. Encontramos pessoas que moram perto dessas veredas, que viam desde a infância a fartura e outras características da região. Encontramos muitas histórias de Rosa, palcos de agens do livro, inclusive da batalha final. Foi maravilhoso. Foi uma das séries de reportagens mais difíceis, que a gente lutou de peito aberto para fazer. Acho que isso é o mais importante”, relatou Mateus Parreiras durante a premiação.
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5 mil quilômetros no sertão de Rosa
A fase de campo das apurações, com equipes de reportagem rodando pelo sertão mencionado na obra de Rosa ou em terras percorridas pelo autor para produzi-la, durou 12 dias e percorreu quase 5 mil quilômetros – boa parte por trilhas e estradas de terra não mapeadas. Especialistas e ambientalistas ajudaram a mostrar o tamanho dos impactos da degradação ambiental sobre o cerrado, as veredas e fontes de água, bem como o potencial de agravamento dos destrutivos eventos climáticos extremos.
De acordo com o diretor de Redação do Estado de Minas, a série nasceu de uma interrogação. Com a apuração dos repórteres, foi possível revelar a realidade e a agonia atual das veredas. O trabalho coletivo possibilitou entender que as paisagens imortalizadas na literatura pelo clássico de Rosa estão desaparecendo na vida real, e que, se nada for feito, vão acabar.
Para Carlos Marcelo, a premiação representa reconhecimento e respeito pela natureza, com o destaque de ser organizada por um jornalista, Hiram Firmino, que também foi um dos pioneiros na cobertura do setor ambiental. “O prêmio vem de um jornalista; ratifica a relevância do nosso trabalho e serve como alerta, porque essas paisagens estão desaparecendo. O que os repórteres documentaram é que as ações predatórias dos homens estão acabando com as veredas”, afirmou.
“Talvez elas fiquem apenas na memória, na leitura dos livros de Guimarães Rosa, porque, infelizmente, o que os repórteres como Mateus, Luiz e Guzanshe documentaram é que as veredas que tanto encantavam, que são maravilhosas, estão sumindo por causa da ação do homem e também das mudanças climáticas extremas”, acrescentou Carlos Marcelo.
Destacando o esforço coletivo de produção, elaboração e publicação da série de reportagens, o repórter Luiz Ribeiro revelou sua gratidão por ter contribuído com uma apuração que “lançou luz sobre a necessidade de preservação das veredas, das nascentes, das águas e da vida”. “A premiação é um reconhecimento ao verdadeiro jornalismo, feito com afinco e dedicação”, afirmou. Na mesma linha, o repórter fotográfico Alexandre Guzanshe classificou a reportagem como uma das mais importantes de seus 25 anos de profissão e 15 de Estado de Minas. “Foi um trabalho inesquecível e de excelência”.
Premiação é o Oscar do setor
O Prêmio Hugo Werneck é uma referência na área ambiental e reconhece os melhores projetos em prol da preservação. Foi criado em 2010 e batizado em homenagem ao ambientalista mineiro que foi um dos precursores da consciência ecológica na América Latina. Neste ano em sua 15ª edição, se consolidou como destaque nacional, de Minas para o mundo, como o “Oscar da ecologia brasileira”, acumulando mais de mil inscrições e indicações recebidas, além de ter uma lista de 186 vencedores e homenageados até hoje.
Idealizado pela revista Ecológico, o Prêmio Hugo Werneck conta com a participação do governo de Minas, por meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), e, a nível nacional, do Ministério do Meio Ambiente, por meio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
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O ambientalista e fundador da revista Ecológico, Hiram Firmino, reforça a importância da premiação como um apoio a personalidades que lutam pela preservação. “Antigamente, a questão ambiental era dos ambientalistas, considerados os ‘eco-chatos’. Hoje, a questão ambiental é de toda a humanidade. Se você pega um motorista de aplicativo, ele sabe o calor que está fazendo, que está havendo enchentes lá em São Paulo, por causa do desmatamento na Amazônia. Acabaram as árvores, não tem água, não tem nuvem, e, quando tem chuva, vem acumulada”, resume, em relação às mudanças climáticas que atualmente repercutem em todo o planeta.